Conheça a Casa Lasevicius

Empresa :   Casa   Lasevicius    Chocolates
Por Bruno   de   Araujo   Lasevicius
Origem:  São   Paulo   /   São   Paulo





1. Há   quanto   tempo   produz   chocolate?   (ou   sua   família) 

Trabalho com chocolate há cinco anos,  comecei com
  de  chocolate  posteriormente após o contato  com  chocolate especiais e de  origens,  passei a ser  exclusivamente  fundidor. Há  1  ano  e meio me  associei  com  minha irmã Claudia Lasevicius  e  passamos  a  produzir chocolates Bean to  Bar artesanais. A  relação  de  minha  família  com  chocolate é  relativamente antiga,  minha   irmã    Cláudia desde adolescente  produzia doces  e  confeitaria  de chocolate,  até    pouco     tempo   atrás,  ela    abastecia as festas  e reuniões  de  família com brigadeiros e  trufas    por   ela produzidos.  Ela foi uma  forte  fonte  de  inspiração  para    minha  entrada no universo do chocolate.  Fora o fato de  que nossa  família sempre  esteve  ligada    de  alguma  forma  a   algum  tipo de  atividade  artesanal, seja como  hobby ou  mesmo como atividade  geradora  de renda. Desde meu avô materno, ele produzia  perfumes, linguiças artesanais,  e tinha uma  pequena indústria  de artefatos    de    papéis  artesanais. Minha     mãe     foi  produtora    de    perfumes,  de   vitrais  e   trabalhou  com  pedras  decoradas. Enfim, a  família  sempre teve  algum   tipo   de   atividade   empreendedora  ligada    ao  artesanato. Eu  consolidei com    minha  irmã essas  tradições     familiares,  nesta  iniciativa  de  produção   de  chocolate  Bean     to    Bar   artesanais.    

Eu  venho    da  área  de comunicação,  produção de    audiovisuais,  ainda  tenho     uma   atividade   na    TV    Cultura de SP,   trabalho     com  música    erudita. Aos    pouco   estou   preparando  minha  saída do ramo para  me dedicar inteiramente  a  produção   de chocolate. 



2. O  que  significa  para você  ser  produtor  de chocolate  bean  to  bar? 

Produzir chocolate  direto da amêndoa  de cacau  sempre  foi  algo  muito distante, desde  o  período  que trabalhei  com  chocolates belgas e  franceses parecia ser  uma  atividade  impossível  para  ser  realizada em  pequena escala e  artesanalmente. Mas após  um contato nos Estados Unidos  com  os  chocolates  e    as  comunidades  Bean  to Bar  reformulei   meus  conceitos  e  planos sobre fazer  chocolate.  Pesquisei,  me   muni de   informações   adquiri    os  equipamentos,  mas  não consegui   fazer  chocolate    de   imediato.  Pois  faltava   o   mais  importante,    a   matéria   prima  principal: o  cacau.

Há   dois  anos  atrás o  cenário  da produção de  cacau  e  produção    de   chocolates  era    muito  diferente. Hoje,   meados    de   2017,  a  evolução   foi     muito  grande    em     termos   de   ofertas  e  procura    de   amêndoas. Acredito  que já  existam    bem    mais    de  50  produtores   de  chocolates  bean  to  bar   no    Brasil,   de   empresas    de  porte industrial   a   produtores    que  possuem   apenas  1  moinho   de    pedra  para   refinar seus   chocolates.  As  fontes de origem do  cacau  para  chocolate  sempre foram isoladas  dos grandes centros produtores.

Localizadas  no Sul   da  Bahia e   na Amazônia. Hoje  com  a  internet e uma estrutura   de  logística   mais   integrada,   o  cenário  está    mudando e  a relação  entre   os    produtores   de   amêndoas e   de  chocolate  estão  se  estreitando. Está muito   mais  fácil   chegar  aos   produtores  de  cacau  para  chocolate fino  e  suas amêndoas  também chegam   aos produtores   de chocolate   muito  mais  facilmente. Então não  poderia   ter  havido momento  mais   oportuno  para    entrar   no  mundo  do  chocolate  Bean to Bar.

Não  só  o  cacau,  mas os  equipamentos  de  pequeno  porte,  adequados  a  produção   artesanal,  já   começam  a  ser  produzidos aqui  ou  também  tem   havido a   oferta   de   maquinário   e  dispositivos   importados. O  chocolate  é   ao     mesmo     tempo    muito    simples   pois    leva  somente dois ou  três  ingredientes  em  sua  produção,    mas    por   outro lado   é  muito complexo,   pois   possui  processo    de  produção   detalhados  e  demorados.  São   muitas    etapas    que    oferecem    muitas possibilidades  de   variações. E,  quanto   mais   se  faz  chocolate,    melhor  eles  vão ficando,   você  vai   entendendo  como  os  elementos   se  combinam,  vai  entendendo    melhor  determinado  cacau.

Tenho o    privilégio  de    trabalhar  com  cacaus  de    diversos    produtores,    pois   não  os  planto.  Tenho  uma   visão  panorâmica     do  cenário    do     cacau    no    Brasil,  conheci   os  melhores  e   alguns   poucos    não     tão     bons,    tive    muita     sorte   principalmente   no  início.  O que  aprendi   nesse     tempo     que  faço     chocolate  é    que   com    poucas    e   simples    máquinas  posso   chegar  a   produzir  o  melhor  chocolate  do mundo    é     só   ter   uma     boa    amêndoa     e  entendê-­la  e  respeitá-­la.    Isso  é  fascinante com nem  tantos recursos  e algum  conhecimento   e  sensibilidade  se  produz    algo  que dificilmente  pode ser  imitado  ou  reproduzido  industrialmente  em    escala.  Mas  somente  um    bom   chocolate não  é     condição    para    o  sucesso   de     uma  empresa,  o  grande    desafio    é  conseguir     ter     um produto    excelente    e  um    negócio   sustentável   e  lucrativo.

Um   chocolate    nessa  proposta  que    estamos   produzindo  acaba     sendo    muito   mais    que   uma     excelente    barra  em  si. Existe    um   conceito  por  trás  do   produto  e  toda  uma  cadeia   produtiva   que    articula  outros  tantos  conceitos  e    pessoas  do  produtor   do  cacau  ao  lojista  que repassa para  o consumidor final. Esse tem  sido  nosso  maior   desafio. 

Crescer, ser  sustentável e  se manter fiel  aos conceitos  e  objetivos  que  definimos   perseguir,  essa  tem  sido  também   nossa  maior  conquista.




3.Há   algo   especial   na  rotina   da fazenda   ou   na   mata   de   cacau   que   você gostaria   que   o   mercado   soubesse?

Acho que conhecer  o trabalho dos produtores  de cacau  uma  coisa  fundamental para que faz  chocolate  bean  to bar.  Conhecer in  loco, quero  dizer. Mudou minha  vida no mundo do  chocolate,  ter  tido essa oportunidade.  Porque  começamos  a   entender  a   razão   dos  resultados   que  obtemos  com  as  amêndoas, e em    alguns casos podemos até auxiliar    no  aprimoramento  delas. Entender  os  ciclos  do   cultivo,  colheita   e    pós  colheita   muda  tudo.

A  questão  das    origens,   dos   terroirs,  dos  varietais,   dos blends  naturais.  Até mesmo  as   aspectos  climáticos   e   os   fatores    humanos    na   produção fazem  toda    diferença. Relacionar  tudo   com    os   resultados    dos  chocolates    é    um    divisor    de    águas,     na   produção    de   chocolate  de  qualidade.  A    qualidade  em    muitos    aspectos     está    nos   pequenos   detalhes,  que   provocam    grandes     saltos    qualitativos  tanto     na     lavoura     como  no     refino    do     cacau   em   chocolate.    por    esse     motivo    que     dou    grande  valor   e   respeito    para  quem   vai    a     fundo  em     seu   ofício,  principalmente    a     figura     do     fermentador    de     cacau,   que   desempenha    papel  fundamental    no    processo    de     transformar    os     frutos    do     cacaueiro    em  amêndoas    para     chocolate.     Em    alguns     casos    o     próprio    agricultor   ou     fazendeiro    acumula  as     funções   ligadas    ao   cultivo     e    pós     colheita,    eu    arrisco  em     chamar    essa     figura    de   cacaólogo,    especialista     em     cacau.  Tudo    acaba     tendo   relevância,    uma     vez    que     considero  o  terroir    um     dos     pontos    mais    decisivos    para  a     transformação    do     cacau  em    amêndoas  para     chocolate.    A  origem    acaba   tendo   um  peso     até  maior    que o   próprio     varietal,     na  maioria    dos  casos. Quando     falo    origem   penso    em    microclima,    single     plantation, pessoas    específicas.

Tive  experiências    muito     curiosas    de     pegar   amêndoas   de     mesmo  varietal,    de    uma   mesma   região     (Sul     da  Bahia)  e     ter    resultados   completamente    diversos.  Acredito   que   em     função    desses    pequenos    detalhes    quando  articulados   fazem     toda diferença. Considero  então     que     o     caráter    mais    marcante     do     cacau   brasileiro     sejam     os  terroirs.    Acrescento     a     essa     observação    a    experiência     recente     que     venho     tendo    com   cacau     cultivado    na     região     amazônica,    que     na    grande    maioria     dos     casos     são    espécies  híbridas     implantadas    por     iniciativas    de    órgãos    governamentais     como   a CEPLAC.  Embora    o     cacau     seja     nativo    da    amazônia    essas    espécies     introduzidas     são  mais  produtivas    e   resistentes    a     doença  que    os   cacaueiros    nativos   ou     selvagens.   Então  temos    os    mesmos     varietais     cultivados    no    Sul     da     Bahia     sendo  cultivados     na  Amazônia,    principalmente    no estado do  Pará.  E para    minha  surpresa   os resultados     no  chocolate  são    muito    diferentes    dos    que     consigo     com   material   similar da     Bahia, então    no     nosso   caso    o   terroir    acaba   tendo  um    peso     até   maior    que   a    questão   dos   varietais. 
             
Uma     vez    que    no    Brasil,  de  uma  maneira geral,    quase não se  cultiva  cacau  segregado ou varietais,    em     virtude     de     vários    acontecimentos    históricos. Nossas  roças  tem   uma    diversidade  muito   grande  de  varietais misturados, e    não   somente    diversidade  de  cacaueiros  convivendo  em    um    mesmo    espaço,    em    alguns   casos    uma    mesma     raiz  possui    dois   os   três    galhos    de  varietais    distintos    nela   enxertados,  cada    galho   produzindo    um     varietal  diferente.  Como não tem   segregação  temos  a  polinização   cruzada  também,    um  fruto que possui  sementes    de    mais  de  um  varietal  dentro  dele.  Para  nossa  sorte  o  que acaba     fazendo  a    diferença    acaba     sendo    esse  somatório    de   fatores    que combinadas  resultam   em cacaus    diferentes    a  cada terroir. Nosso Cacau  em última análise possui  características distintas    dos cacaus produzidos   em    outros  lugares   em   virtude  da     forte   predominância   do terroir.  Não    podemos   aplicar  parâmetros    que  funcionam    em  outros   terroirs   simplesmente. Temos que   procurar  nosso caminho,     estabelecer    nossa paleta  olfato­gustativa, perseguir objetivos  que  respeitem    nossas  singularidades  e gosto. Acredito  que    devamos  inclusive propor  caminhos, valorizar    nossas singularidades  ter    orgulho    de    nossa identidade gastronômica. O  reconhecimento    de    nossos   valores    deve     começar    em     casa.

No     meu     trabalho   de  chocolatemaker  sinto    na    boca  o    que    estou     falando,    no  início buscava    minhas    referências     sensoriais    nos   modelos    europeus    e    mais     recentemente     nos    norte     americanos,  mas  faltava    alguma     coisa,  algum    elemento    que    desse     conta   de     dar   sentido    ao    que     sensorialmente  eu  vinha   sentindo.    Encontrei     esse    universo    na   minha     visita     que     fiz    a    meus     parceiros    fornecedores    de    amêndoas   do     Sul     da   Bahia.  Tive  contato   e   provei    as  frutas    da     região,  ai    estava    meu     sistema     de     referências,     para    entender  o     chocolate     que    produzia.

                                               

4. Há   algo   especial   na   rotina   de   produção   de   chocolate   que   você  gostaria que o mercado soubesse?

Fazer chocolate  é  realmente     uma     rotina,    no    meu   caso, produzo  todo  chocolate Bean to   Bar comercializado    pela     Casa  Lasevicius. Como    produzimos   artesanalmente, produzimos   em     pequenos     lotes,    então    o     trabalho    é    diário,    os     ciclos    e     tempos  devem     ser  respeitados     com    muita    atenção  e    presença. Fazer     chocolate     artesanal     é  muito     similar    a     cozinhar:    e     faz     toda    diferença     cozinhar    para     um   jantar    especial     para  poucas    e     seletas    pessoas  do    que     cozinhar     para    um    batalhão  de    pessoas. Considero   então     minha   rotina    algo    muito    especial,    que   a     cada     lote   produz   um   alimento    diferenciado     de     extrema    qualidade    que    começa    na     fazenda   que     cultiva   as   amêndoas    e termina    no  consumidor    apreciador     de     nosso     chocolate     refinado.  É   uma     coisa    que     envolve     muitas    pessoas     cuidadosas    e    dedicadas,     que   leva   muitos  dias    para    partir     do     fruto     do     cacau    e     se     chegar  à     barra    de     chocolate     embalada.  Poucas     coisas     são     fechadas    na    produção    do     chocolate

As     amêndoas   são  resultado    de    processos    naturais     sujeitos    a     muitas     variáveis,   então    a     todo    momento    tem    que     se    estar     atento     a    pequenas     variações    nos   padrões    dos   insumos   para     se     ter   um    produto     com     identidade    e     qualidade.    A    ideia    então     não     seria     produzir    mecanicamente,   automaticamente,     e     sim     ir    a     todo     momento     a     busca    da    excelência   monitorando   e  tomando  as    decisões    certas  para   se chegar    ao     chocolate perfeito. Não  se  pode  ser   absorvido     pela  rotina  e  sim  se  utilizar dela  para    aprimorar   seu    ofício,    nesse  caso  a     repetição leva   ao  aprimoramento  e  à  perfeição.



 5. Qual   sua opinião  sobre   a   relação   do   consumo do   chocolate   com    o  turismo   em   sua    região?

Sou   de    São Paulo  Capital,  a  Meca   gastronômica    do     Brasil,    pelo     menos  assim   acreditamos  que seja.  O  turismo  gastronômico    é    uma  atividade    muito     importante   por     aqui,  mas    acredito  que   o     consumo     de  chocolate  ocorra no   contexto  do    pacote  genérico  da    gastronomia, não  conheço    algo   temático    e    específico  como    ocorre    no   Sul  da   Bahia,     região    de  Ilhéus    e   como    no   Sul,  em Gramado.  Temos  a  cidade   de     Campos   do   Jordão    aqui    em    SP,  mas    acredito    que    esteja    ainda    muito    no   início,   nada     comparado  as    duas citadas   anteriormente.    De uma maneira geral  o  consumo  do  chocolate   aqui  ocorre  dentro  do contexto  do negócio gastronômico, seja em  cafés, restaurantes,  confeitarias  e  varejo de  nicho. 



6.  O   que   garante   qualidade   de   chocolate   na   sua   opinião?

Acredito  que  sejam    os    pequenos    detalhes,  como  mencionei    antes,    mas   o somatório   de   todos  eles ao  longo de  toda  cadeia    produtiva  do  cacau  e chocolate, das  práticas agrícolas   para o cultivo  das  amêndoas  à  embalagem  do  chocolate  tudo  é   importante.

7. Qual o segredo   da   sua   formulação   de   chocolate?                                                                       

A ferramenta   mais   importante nesse  processo  todo sou eu,   minha  capacidade  sensorial para  apreciar  chocolates.  É  por   meio  dela  que  tomo minhas decisões   da  compra das amêndoas  a definição da  formulação  dos  chocolates. Não posso  deixar de  lado  o gosto  dos consumidores,  mas  acho que  temos  a  obrigação de propor   caminhos e tendências para  o consumo  de  chocolate. Experimentar  muito é  também uma  coisa muito  importante para  se  adquirir  repertório  gastronômico no universo do  chocolate, conhecer o trabalhos de outros chocolatemakers  é  também  muito  importante,   uma vez que  a produção  artesanal  é   um  setor  com  muita  agilidade para  se renovar  e  aprimorar.   


8. Quais  desafios  são  enfrentados  para   posicionar chocolate no  mercado brasileiro?
         
O poder  aquisitivo  e  a cultura  gastronômica,  hoje  seriam    os    maiores     desafios    a     serem   superados,  acredito  que estamos caminhando  muito nesse sentido. Pouco a  pouco  nossos  chocolates vão agregando valores relevantes  para  os    mercados  consumidores  dos chocolates   especiais.  Colocando inclusive  o  poder  aquisitivo em  um  segundo plano. 

9.   Qual   segredo   para   apreciar  um bom chocolate?
            
Em  primeiro  lugar   afinar   o  sistema  perceptivo  e  treinar  o  paladar  para  as sutilezas oferecidas  pelo   chocolate. Conhecer muitos  chocolates    de    diversas modalidades existem   muitos   tipos   de  chocolate  que    possuem   seus  valores,  acredito  que   seja   como  o  vinho    e  o   café,  existem    muitos tipos    de  cafés   e   uvas    e   muitas    maneiras  de prepará-­las.  O chocolate   possui     um    aspecto    de  agregador  social  muito  forte,    maior     que   o  do   café   e    o   do     vinho,    é     mais     fácil  compartilhar    uma  barra    de  chocolate  do   que  uma xícara  de café  ou    uma taça  de   vinho. Então    a    prática    da   degustação  social    do  chocolate    é   fantástica  para     se  aprimorar    a     capacidade  de  apreciação    do     chocolate.

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