Cupuaçu: Brasilidade, Cultura Alimentar e os Caminhos com o Chocolate (Cupuaçu: Brazilian Identity, Food Culture, and Its Journey with Chocolate)



Cupuaçu: Brasilidade, Cultura Alimentar e os seus caminhos junto ao Chocolate

por Juliana Recuero Ustra


Este texto nasce de uma reflexão pessoal e profissional. Confesso: gosto de pistache. Mas, se posso escolher, prefiro preferir o cupuaçu — assim como tantos outros ingredientes genuinamente brasileiros. Frutas, ervas, chás, sementes, flores e especiarias que carregam em si nossa ancestralidade e a força dos nossos biomas.


Uma fruta que traduz brasilidade


Aromático, nutritivo e versátil, o cupuaçu cria, ao se encontrar com o chocolate, uma alquimia surpreendente. Não por acaso, já brilha em chocolates premiados no International Chocolate Awards e na Academy of Chocolate de Londres.


Esse protagonismo confirma uma convicção que carrego: o chocolate é uma lente poderosa para revelar a cultura alimentar de um território. E quando trazemos o cupuaçu para o centro das criações, mostramos ao mundo uma expressão autêntica de brasilidade.


Potencial da nossa biodiversidade


Minha trajetória tem sido dedicada ao estudo do mercado de chocolate brasileiro e global. A cada análise, percebo como ingredientes locais despertam fascínio no exterior. O cupuaçu é um exemplo emblemático: nativo, abundante, encantador — e ainda pouco explorado em nossa própria mesa.


Como consultora e curadora de experiências gastronômicas, vejo nesse fruto (e em tantos outros) uma oportunidade de transformar biodiversidade em produtos, narrativas e identidade cultural.


Ingredientes nativos por biomas brasileiros


Os biomas do Brasil oferecem uma verdadeira caixa de tesouros gastronômicos. Eis alguns exemplos:

  • Amazônia: cupuaçu, açaí, bacaba, buriti, castanha-do-Brasil, tucumã, muruci.

  • Cerrado: baru, pequi, mangaba, araticum, cagaita, jatobá.

  • Mata Atlântica: jabuticaba, cambuci, uvaia, pitanga, araçá.

  • Caatinga: umbu, mandacaru, licuri, maracujá-do-mato.

  • Pampa: butiá, ervas nativas (carqueja, marcela).

  • Pantanal: guavira, bocaiuva, ingá, jenipapo.


Para quem atua em chocolate, confeitaria e gastronomia, esse repertório é um convite à inovação com autenticidade. Cada ingrediente carrega histórias de território, ancestralidade e biodiversidade, capazes de enriquecer receitas e construir uma identidade gastronômica única no mundo.


Narrativas e identidade cultural


Alimento é mais do que sabor: é território, história e memória. Por isso, desenvolvi uma metodologia de 14 pilares narrativos, que aplico em análises de marcas brasileiras e estrangeiras que aparecem no mercado com relevância ou ainda marcas premiadas em concursos internacionais para chocolates e também através consultorias.


Nesse mergulho, o cupuaçu (assim como tantas frutas nativas) aparece com recorrência como ingrediente cultural: fala sobre nossa terra, nossas influências e nossa diversidade.


O olhar regulatório e a provocação


Apesar de cultivado em várias regiões, ainda são poucas as empresas legalizadas para fornecimento de cupuaçu em escala significativa para a indústria que o usa como inclusão para produção de chocolates. Essa limitação, que conheço bem desde minha atuação em assuntos regulatórios (desde 1998), restringe seu potencial de mercado.


Enquanto isso, seguimos fascinados por ingredientes estrangeiros — como o pistache, que ganhou espaço no consumo brasileiro. Mas por que importar tendências quando temos tesouros nativos à espera de valorização?


Dados oficiais para refletir

  • Cupuaçu no Brasil:

    • Em 2017, segundo o IBGE (Censo Agropecuário), a produção foi de 21.240 toneladas, em 13.504 hectares, com 15.747 produtores.

    • No Amazonas, há 5.292 hectares em produção, com cerca de 10,6 milhões de frutos (dados Ministério da Agricultura / Embrapa).

    • No Pará, em 2024, a produção estimada chegou a 29.000 toneladas em 8.900 hectares, com predominância de agricultura familiar.

  • Pistache no Brasil:

    • Segundo a Embrapa Agroindústria Tropical, 100% do consumo atual é importado.

    • As importações triplicaram desde 2022, alcançando 1.000 toneladas em 2024.

    • Há projetos-piloto de cultivo no Ceará previstos para 2027, mas as colheitas comerciais só devem começar entre 2035–2040.


Esses números revelam um contraste: enquanto importamos pistache, ainda não valorizamos plenamente frutos como o cupuaçu, que já fazem parte da nossa terra e cultura alimentar.


O que está faltando?


Desenvolvimento de Mercado? Cultura? Autoestima alimentar?

Para consolidar o valor do chocolate brasileiro no mundo, precisamos reconhecer e valorizar o que já é nosso.


Convite à reflexão


Repensar o uso de ingredientes nativos significa:

  • Fortalecer economias locais.

  • Estimular colaborações criativas.

  • Investir em inovação com identidade.

  • Valorizar nossa cultura alimentar.

  • Reconectar consumo e ancestralidade.


Essa é a provocação que levo para palestras, consultorias e curadorias gastronômicas: como transformar nossa biodiversidade em narrativas, experiências e produtos com valor cultural, econômico e emocional.


E você, o que prefere: importar tendências ou valorizar o que já é nosso?


Juliana Recuero Ustra

em 29/09/2025



Acompanhe as novidades no Instagram: @chocolatenobrasil

E para quem quiser compreender mais sobre minha trajetória leia aqui: Carta Aberta Expedição Cacau e Chocolate do Brasil

📩 Fale comigo: chocolate@ustra.com.br




-------------------

Cupuaçu: Brazilian Identity, Food Culture, and Its Journey with Chocolate

by Juliana Recuero Ustra


This text is born from both personal and professional reflection. I admit: I like pistachios. But, if I have the chance, I prefer to prefer cupuaçu — and of course, many other genuinely Brazilian ingredients. Fruits, herbs, teas, seeds, flowers, and spices that carry our ancestry and the strength of our biomes.


A fruit that embodies Brazilian identity


Aromatic, nutritious, and versatile, cupuaçu creates, when combined with chocolate, a surprising alchemy. It is no coincidence that I increasingly see cupuaçu shining in award-winning chocolates at the International Chocolate Awards and the Academy of Chocolate in London.

This prominence confirms something I have long defended: chocolate is a powerful lens to reveal the food culture of a territory. By placing cupuaçu at the center of creations, we showcase to the world an authentic expression of Brazilian identity.


The potential of our biodiversity


I have dedicated my career to studying the Brazilian chocolate market and, in recent years, the global market as well. With each analysis, I see how local ingredients capture international fascination. Cupuaçu is a perfect example: native, abundant, delightful — and still underexplored in our own daily consumption.

As a consultant and curator of gastronomic experiences, I see in this fruit (and many others) the opportunity to transform biodiversity into products, narratives, and cultural identity.


Native ingredients by Brazilian biomes


Brazilian biomes offer a true treasure chest of gastronomy. Here are a few examples:

  • Amazon: cupuaçu, açaí, bacaba, buriti, Brazil nut, tucumã, muruci.

  • Cerrado: baru (baru nut), pequi, mangaba, araticum, cagaita, jatobá.

  • Atlantic Forest: jabuticaba, cambuci, uvaia, pitanga, araçá.

  • Caatinga: umbu, mandacaru, licuri, wild passionfruit.

  • Pampa: butiá, native herbs (carqueja, marcela).

  • Pantanal: guavira, bocaiuva, ingá, jenipapo.


For professionals in chocolate, pastry, and gastronomy, this repertoire is an invitation to innovate with authenticity. Each ingredient carries stories of territory, ancestry, and biodiversity — enriching recipes and helping build a gastronomic identity that only Brazil can offer the world.


Narratives and cultural identity


Food is more than flavor: it is territory, history, and memory. That’s why I developed a methodology with 14 narrative pillars, which I apply in analyses of both Brazilian and international brands — particularly those recognized in global chocolate awards.

Through this lens, cupuaçu (as well as many other native fruits) often emerges as a cultural ingredient: it speaks of our land, our influences, and our diversity.


A regulatory perspective and a provocation


Although cultivated in several regions, few companies are authorized to supply cupuaçu on a significant scale to the food industry. This limitation, which I know well from my background in regulatory affairs (since 1998), restricts its market potential.

Meanwhile, Brazilians remain fascinated by foreign ingredients — like pistachio, which has grown in popularity. But why import trends when we have native treasures waiting for recognition?


Official data for reflection


Cupuaçu in Brazil:

  • In 2017, according to the IBGE Agricultural Census, national production reached 21,240 tons, covering 13,504 hectares, with 15,747 producers.

  • In Amazonas, there are 5,292 hectares in production, yielding around 10.6 million fruits (Ministry of Agriculture / Embrapa).

  • In Pará, by 2024, estimates reached 29,000 tons across 8,900 hectares, mostly from family farming.

Pistachios in Brazil:

  • According to Embrapa Tropical Agroindustry, 100% of pistachios consumed in Brazil are imported.

  • Imports tripled since 2022, reaching 1,000 tons in 2024.

  • Embrapa has launched pilot cultivation projects in Ceará, expected to begin in 2027, with commercial harvests projected only between 2035–2040.

These numbers reveal a stark contrast: while we import pistachios, we still fail to fully value native fruits like cupuaçu, deeply rooted in our land and food culture.


What is missing?


Market development? Cultural awareness? Food self-esteem?

To consolidate the value of Brazilian chocolate worldwide, we must recognize and revalue what is already ours.


An invitation to reflection


Rethinking the use of native ingredients means:

  • Strengthening local economies.

  • Stimulating creative collaborations.

  • Investing in identity-driven innovation.

  • Valuing Brazilian food culture.

  • Reconnecting consumption and ancestry.


This is the provocation I bring to lectures, consulting, and curatorial projects: how to transform biodiversity into narratives, experiences, and products with cultural, economic, and emotional value.

 And you, what do you prefer: importing trends or valuing what is already ours?



Juliana Recuero Ustra
Researcher, chemical engineer, consultant in narratives and chocolate markets.
Founder of the Expedição Cacau e Chocolate do Brasil.

 Follow on Instagram: @chocolatenobrasil
 Read more: Open Letter – Expedição Cacau e Chocolate do Brasil
 Listen to the Playlist: Expedição Cacau e Chocolate do Brasil


Comentários