O pote e a experiência
Parece titulo de redação infantil, mas é uma reflexão que tive há uns minutos e preciso compartilhar, quem sabe provocar discussão e opiniões diversas.
Este texto é resumo do que vivenciei hoje a noite quando levei minha filha de 9 anos a um filme infantil badalado. Um dia antes, enquanto combinávamos a programação, ela anuncia que "precisava" comprar umas drágeas de uma marca famosa, vendidas na porta do cinema.
"Como assim?" - Digo meio reticente, pois seria consumo de doce a noite e qualquer mãe/pai sabe o que isto representa. Ainda mais por ser uma marca bem conhecida, mas que não consumimos pois é guloseima, afinal temos acesso às grandes marcas brasileiras, com sabores complexos, rótulos lindos, vindas de agroflorestas e preparadas com todos cuidados possíveis, e muitas vezes por chocolatiers que hoje se tornaram amigos nossos.
Respondo então a ela, na tentativa de negociação e de deixar para provar num outro momento: "Podemos comprar no supermercado esta tal marca, fica tranquila..."
"Não, mãe. Lá no cinema, tem uma área só desta marca, onde estão sabores que não são vendidos no supermercado, e a gente escolhe o que vai no pote".
"...Mas que pote é este? E, que diferença tem este pote do chocolate vendido no pacotinho" - questiono mais curiosa ainda para saber aonde este diálogo me levaria.
"O pote". - "O pote", dito como algo definitivo, necessário para a tal noite de cinema. Algo que vinha com algum valor, valor que eu ainda não identificara enquanto nossa conversa se desenvolvia.
Pois bem, concordei em ver o que seria "o tal pote" no dia seguinte. Assunto encerrado, por hora.
Encerrado coisa nenhuma, pois hoje no dia do cinema ela me relembra. "Mãe, vamos comprar o pote, não é?" . Assim fico mais intrigada ainda me perguntando o porquê ela queria tanto comprar algo que poderia ser comprado em qualquer supermercado ou loja de conveniência, mas ainda assim insiste: "tem que ser no pote, é muito legal".
Pois bem, na porta do cinema nos deparamos com a tal lojinha onde as tais drágeas eram vendidas, "no pote". Lá, há dispensers individuais para cada sabor de drágea, tudo a vista, muito colorido, muito provocador aos olhos de uma criança (e quem sabe de alguns adultos também). Levou algo como dez segundos para decidirmos qual sabor sairia e o tamanho do "pote", logo o atendente nos serviu, me dei conta do seguinte.
O cliente hoje quer interagir com o alimento, quer ser parte da experiência do serviço. Quer ver de onde vem. Quer decidir a quantidade. Neste caso em especial o chocolate no pote nem é chocolate, é uma guloseima em forma drágea colorida e aromatizada, no nosso caso, uma cobertura em uma uva passa. Portanto, além das fibras, não traz nenhum beneficio à saúde. Quanto à origem, nem sei qual é. Só sei que desta marca não conheço "rostos" envolvidos no processo de produção, nem sei de que floresta vem o porcentual pequeno de cacau que imagino ter por ali...
Só sei que a pequena formadora de opinião me convenceu a entrar numa experiência rápida e nova com o tal "pote" e confesso que concordei para entender a proposta toda.
Fica a reflexão:
- Estes atributos do produto e de seu marketing, os quais levaram esta menina a escolher o tal "pote" de drágeas, seriam aplicados a chocolates de verdade?
- Já temos marcas de chocolate genuíno sendo ofertadas com tamanha "agilidade e eficácia" para formar opinião de crianças e adultos?
- Qual caminho mais potente para que as pessoas entendam o valor agregado de um chocolate, que numa mesma barra apresente sabor, saúde e sustentabilidade?
A experiência do "pote" fica para reflexão, a qual leva mais tempo do que o próprio consumo, pois provamos em pouco minutos, não trazendo nenhum terroir, nenhum after taste, sem snap, nem espalhabilidade durante o derretimento, só um deleite rápido que o açúcar traz...
E, aí? Já pensou em encontrar um chocolate de verdade e ao mesmo tempo uma experiência?
Quanto ao filme? Foi bárbaro, mas como não sou comentarista de cinema, isto fica para as conversas mais internas por aqui...
Ótima reflexão, Ju! Realmente temos que pensar e muito como atingir o público de uma forma tão diferente quanto o nosso produto. Não podemos ser mais do mesmo. Faz parte do consumo do nosso chocolate a experiência. Essa deve ser muito mais estudada!
ResponderExcluirInteressante sua reflexão, Ju!
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